Viktor E. Frankl
Um Psicólogo no Campo de Concentração
Em Busca de Sentido - PREFÁCIO · 1984
O escritor e psiquiatra Viktor Frankl costuma perguntar a seus pacientes quando estão sofrendo muitos tormentos grandes e pequenos "Por que não opta pelo suicídio?" É a partir das respostas a esta pergunta que ele encontra, freqüentemente, as linhas centrais da psicoterapia a ser usada.
Num caso, a pessoa se agarra ao amor pelos filhos; em outro, há um talento para ser usado, e, num terceiro caso, velhas recordações que vale a pena preservar.
Costurar estes débeis filamentos de uma vida semi-destruída e construir com eles, um padrão firme, com um significado e uma responsabilidade - este é o objetivo e o desafio da logoterapia, versão da moderna análise existencial elaborada pelo próprio Dr. Frankl.
Neste livro, o Dr. Frankl descreve a experiência que o levou à descoberta da logoterapia. Prisioneiro durante longo tempo em campos de concentração, onde seres humanos eram tratados de modo pior do que se fossem animais ele se viu reduzido aos limites entre o ser e o não-ser.
O pai, a mãe, o irmão e a esposa de Viktor Frankl morreram em campos de concentração ou em crematórios, e exceto sua irmã, toda sua família morreu nos campos de concentração.
Como foi que ele - tendo perdido tudo o que era seu, com todos os seus valores destruídos, sofrendo de fome, do frio e da brutalidade, esperando a cada momento a sua exterminação final - conseguiu encarar a vida como algo que valia a pena preservar?
Um psiquiatra que passou pessoalmente por tamanha experiência certamente tem algo a dizer.
Ele - mais que ninguém - pode ser capaz de ver a nossa condição humana com sabedoria e compaixão. As palavras do Dr. Frankl têm um acento profundamente honesto, porque estão baseadas em experiências tão profundas que impedem qualquer distorção.
O que ele tem a dizer ganha em prestígio devido à sua atual posição na Faculdade de Medicina da Universidade de Viena e por causa do renome das clínicas logoterapêuticas que hoje estão funcionando em muitos países, segundo o padrão da famosa Policlínica Neurológica de Viktor Frankl em Viena.
É impossível evitar a comparação entre os enfoques terapêutico e teórico de Frankl e o trabalho do seu predecessor, Sigmund Freud. Os dois se preocuparam basicamente com a natureza e a cura das neuroses. Freud encontra a raiz destas desordens angustiantes na ansiedade causada por motivos inconscientes e conflitantes.
Frankl distingue várias formas de neurose e atribui algumas delas (as neuroses orgânicas) à incapacidade de encontrar um significado e um sentido de responsabilidade em sua existência.
Freud acentua as frustrações da vida sexual; Frankl, a frustração do desejo de sentido e significado. Na Europa, hoje, há uma forte tendência a um distanciamento de Freud e a uma aproximação da análise existencial, que assume várias formas - entre elas a escola de logoterapia. Frankl não repudia a postura de Freud - e isto é típico da sua atitude tolerante - mas constrói seu trabalho de bom grado sobre as contribuições freudianas. Tampouco ataca as outras formas de terapia existencial, mas aceita com satisfação o parentesco da logoterapia com elas.
Esta narrativa, embora breve, é muito bem construída e atraente. Por duas vezes eu a li sem levantar uma só vez da poltrona, incapaz de me afastar da seqüência de suas palavras.
Em algum momento, depois da metade da história, o Dr. Frankl introduz sua própria filosofia logoterapêutica, mas o faz de modo tão suave ao longo da narrativa que só depois de terminar a leitura é que o leitor percebe tratar-se de um profundo ensaio, e não apenas de mais uma história sobre as brutalidades dos campos de concentração.
O leitor pode aprender muito com este fragmento autobiográfico. Ele percebe o que um ser humano faz quando subitamente compreende que não tem "nada a perder senão sua existência tão ridiculamente nua". Frankl faz uma cativante descrição do misto de emoção e apatia.
Primeiro surge uma fria e distante curiosidade de saber o próprio destino. Depois surgem estratégias de preservação do que resta de vida, apesar das chances de sobreviver serem pequenas. Fome, humilhação, medo e profunda raiva das injustiças são dominadas graças às imagens sempre presentes de pessoas amadas, graças ao sentimento religioso, a um amargo senso de humor e até mesmo graças às visões curativas de belezas naturais - uma árvore ou um pôr-do-sol.
Mas estes momentos de conforto não estabelecem o desejo de viver - a menos que ajudem o prisioneiro a ver um sentido maior no seu sofrimento aparentemente destituído de significado. É aqui que encontramos o tema central do existencialismo.
A vida é sofrimento, e sobreviver é encontrar significado na dor, se há, de algum modo, um propósito na vida, deve haver também um significado na dor e na morte.
Mas pessoa alguma é capaz de dizer o que é este propósito.
Cada um deve descobri-lo por si mesmo, e aceitar a responsabilidade que sua resposta implica.
Se tiver êxito, continuará a crescer apesar de todas as indignidades.
Frankl gosta de citar esta frase de Nietzsche: "Quem tem por que viver pode suportar quase qualquer como."
No campo de concentração todas as circunstâncias conspiram para fazer o prisioneiro perder seu controle. Todos os objetivos comuns da vida estão desfeitos.
A única coisa que sobrou é "a última liberdade humana" - a capacidade de escolher a atitude pessoal que se assume diante de determinado conjunto de circunstâncias".
Esta liberdade última, reconhecida pelos antigos estóicos e pelos modernos existencialistas, assume um vívido significado na história de Frankl.
Os prisioneiros eram apenas cidadãos comuns; mas alguns, pelo menos, comprovaram a capacidade humana de erguer-se acima do seu destino externo ao optarem por serem "dignos do seu sofrimento".
Naturalmente, o autor, como psicoterapeuta, deseja saber como se pode ajudar as pessoas a alcançar esta capacidade exclusiva dos humanos.
Como se pode despertar num paciente o sentimento de que é responsável por algo perante a vida, por mais duras que sejam as circunstâncias? Frankl nos dá um emocionante relato de uma sessão terapêutica que teve com seus companheiros de prisão.
Respondendo a um pedido do editor, o Dr. Frankl acrescentou à sua autobiografia uma exposição breve, mas clara dos pontos básicos da logoterapia.
Até agora a maior parte das publicações desta "Terceira Escola Vienense de Psicoterapia" (as anteriores são as de Freud e Adler) tem aparecido em alemão.
Assim, o leitor gostará de ter um texto adicional de Frankl complementando sua narrativa pessoal.
Ao contrário de muitos existencialistas europeus, Frankl não é nem pessimista nem antireligioso.
Ao contrário, para um escritor que enfrenta com coragem a ubiqüidade das forças do mal, ele assume uma visão surpreendentemente positiva da capacidade humana de transcender sua situação difícil e descobrir uma adequada verdade orientadora.
Recomendo sinceramente este pequeno livro, porque é uma obra-prima de narrativa dramática focalizada sobre os mais profundos problemas humanos.
Tem méritos literários e filosóficos e fornece uma estimulante introdução a um dos mais significativos movimentos psicológicos de nossos dias. Gordon W. Allport
Tz note: Gordon W. Allport, professor de Psicologia na Universidade de Harvard, é um dos maiores escritores e professores nesta área no hemisfério norte. Publicou numerosos livros sobre Psicologia e foi o editor do Journal of Abnormal and Social Psychology. Foi principalmente através do trabalho pioneiro do Prof. Allport que a importante teoria de Frankl foi introduzida nos Estados Unidos.
Além disso, é em grande parte graças a ele que o interesse em torno da logoterapia tem crescido exponencialmente neste país.
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