Morrer para Viver

É opinião quase geral que basta morrer para saber o que é Deus, Vida e Seilá.

Após o enforcamento de Adolf Eichmann, em Tel-Aviv, disse o reverendo que em vão tentara convertê-lo: “Agora Eichmann já sabe o que é Deus”.

Entretanto, a simples perda do corpo material não torna ninguém sábio, não faz ninguém melhor ou pior do que foi durante a sua vida terrestre.

O estado de um defunto permanece o mesmo, após-morte, que foi em vida.

O que modifica a pessoa não é a morte, nem mesmo a vida como tal, mas sim uma nova vivência, um outro modo de ser e de agir, nascido da experiência íntima.

Quem não morreu espontaneamente antes de ser morto compulsoriamente, perde o seu tempo.

Disto sabiam e sabem os grandes mestres da vida.

O Cristo diz: “Se o grão de trigo não morrer, ficará estéril – mas, se morrer, produzirá muito fruto”

E Paulo de Tarso escreve: “Eu morro todos os dias – e é por isto que vivo”.

Quem não teve a coragem de morrer decentemente não pode ter a esperança de viver gloriosamente, nem aquém nem além-túmulo.

Carpinteiro de Nazaré insiste: “Não chameis ninguém, sobre a face da terra, vosso pai, vosso mestre, vosso guia”.

O mundo está repleto de espiritualismos – mas é pobre em espiritualidade. A verdadeira espiritualidade nasce duma profunda revelação interior, duma radical “transmentalização” (metánoia), como diz o Evangelho; o humano-ego tem de transcender a sua mentalidade habitual e entrar numa nova dimensão do humano-Eu.

Este processo (João Batista e os Essênios) morte-vida é belamente simbolizado pelo ritual do mergulho (baptisma), representando a morte do velho humano-ego (imersão na água) e o nascimento do novo humano-Eu (emersão) e também por Heráclito.

Se essa transmentalização ou conversão do humano interior não tiver ocorrido, nenhum batismo externo o pode salvar.

O que de fora acontece ao humano não o torna puro nem impuro, não o faz bom nem mau – somente o que de dentro acontece ao humano, isto sim o torna puro ou impuro, bom ou mau.

Em última análise, é o uso ou abuso do livre-arbítrio que abre ao humano as portas do céu ou do inferno.

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